sábado, 18 de janeiro de 2014

A Dolorosa Salvação

Após alguns dias sem se alimentar corretamente e a viver na Igreja, David cambaleia pela cidade até à taverna. Ele sabia que iria ser expulso como das outras vezes, pois, não tinha dinheiro para frequentar aquele lugar.
O taverneiro aproximava-se com uma faca na mão, ameaçando-o que se voltasse o iria matar. Seguidamente, empurra-o para fora do estabelecimento.

David caminhava sem destino pela cidade, quando é interrompido por uma mulher. 

- Não precisas de viver assim... Eu dar-te-ei o que queres... - Disse ela.
David não responde.
- Torna-te meu e terás abrigo e comida. - Acrescentou.
- Nunca. - Disse David numa voz fraca e rouca.
- Já olhaste bem para ti? Não aguentas mais uma semana. Aceita, só terás vantagens... Banquetes estarão à tua espera, uma cama confortável também... E poderás sair quando quiseres... - Explicou ela.
Ele sabia que não iria aguentar aquela vida durante muito mais tempo. A mulher dominante entrega-lhe um papel com várias coisas escritas, com um pão na outra mão: 
- Apenas tens de assinar e terás este pão agora e mais quando voltarmos a casa. - Indica ela.


David assina sem ler nada, os seus olhos semi-cerrados não olhavam para nada a não ser no pão. A mulher atira-lhe o pão e ele rapidamente o devora. 

- Agora acompanha-me... - Disse-lhe ela enquanto se afastava.
David assim o fez.

A Morte

Na noite de Ano Novo, David regressava a casa após uma grande comemoração da passagem de ano. Já decorria o Ano de 1462. Prestes a entrar em casa observa que a porta estava entreaberta, assustado, retira a espada tremedeira e entra devagar. A casa estava quase intacta, reparou que as moedas que tinha deixado perto da entrada tinham sido levadas, assim como alguns objectos com pouco valor.
Não sabia se os assaltantes ainda estariam por ali, por isso, caminhava inseguro, aterrorizado com o que podia encontrar na sua frente. Dá voltas e voltas pela casa sem encontrar ninguém. 

O pior já passou... 

Pensava ele, trancando as janelas e as portas. A corrente de ar fez David reparar numa pena que planava no ar... Era uma pena colorida e grande, parecia ser de Napoleão... David corre para verificar que o seu companheiro estava no campo. Quando lá chega, David não o vê e entra em pânico, a única coisa que lá estava era um dos seus papiros com algo escrito:

"Se queres o animal terás de pagar 1500 cruzados até amanhã, deixa o dinheiro nas ruínas abandonadas da cidade. Se falares disto alguém, o teu perú irá servir de alimentação..."

David sente a sua vida acabar novamente, aquele seu amigo fora raptado.
Juntando todo o seu dinheiro e vendendo algumas coisas, consegue juntar os 1500 cruzados. Já no fim do dia, vai até às velhas ruínas e lá deixou o dinheiro.

Os dias foram passando e Napoleão não aparecia. Acaba por aparecer outra carta:

"Os 1500 não chegam, é preciso mais... se quiseres o teu perú vivo..."

David não pára para pensar ou para descansar, vende tudo o que tem à mão e com muito esforço junta mais mil cruzados. Deixa o saco de cruzados no mesmo local e abandona-o, esperando que Napoleão aparecesse.
Dois dias depois, encontra um saco na porta da sua casa, quando o abre e vê o seu interior, as lágrimas escorrem-lhe pela cara e perde a força das suas pernas. Era o esqueleto de Napoleão ainda com restos de carne nos ossos. 

Nos dias seguintes, David não saiu de casa. Infausto e enfastiado, não saía da cama quase. Acabou por ser expulso da sua casa, pois não tinha dinheiro para a pagar, assim como os seus campos. Vendeu as roupas para se alimentar e foi dormindo na Igreja e nas ruas frias de Leiria. O antigo mercador não passava agora de um pobre mendigo infeliz.